Após viralizar com 'Memórias Póstumas', americana diz que lerá 'Dom Casmurro': 'Pressão dos brasileiros!'

Courtney Henning Novak, de 45 anos, lançou um desafio pessoal: ler um livro de cada país do mundo. Brasil, no entanto, fez com que ela 'desrespeitasse' o próprio regulamento e incluísse mais uma obra de Machado de Assis na lista. Courtney Novak começará a ler 'Dom Casmurro' Reprodução/Instagram Quando começou a ler "Memórias Póstumas de Brás Cubas", a escritora americana Courtney Henning Novak ficou tão obcecada pela obra de Machado de Assis que viralizou nas redes sociais com uma pergunta: "O que vou fazer do resto da minha vida depois que terminá-lo?”. Bom, ela decidiu que rumo tomar. ????????Nesta quinta-feira (6), Courtney anunciou que devorará "Dom Casmurro", outro clássico do autor brasileiro. Com um parque de diversões ao fundo, ela tirou uma foto segurando um exemplar da obra e escreveu, na legenda, que estava "no ambiente perfeito para começar sua nova aventura". "A pressão dos brasileiros é impressionante!", declarou. Ela provavelmente se refere à enxurrada de comentários tentando convencê-la a ler a história de amor de Bentinho e Capitu, publicada em 1899. ????Com perdão pelo trocadilho, mas a verdade é que a americana traiu (ou não?) o regulamento de seu próprio projeto pessoal: ela pretendia ler apenas uma obra de cada país do mundo, em ordem alfabética. Mas não imaginava que encontraria Machado de Assis no caminho. "Memórias Póstumas" foi uma experiência tão arrebatadora que a obrigou, antes de partir para as nações começadas pela letra "C", a incluir um "bônus" na categoria "Brasil". Aguardemos o próximo vídeo apaixonado de Courtney com a resenha de "Dom Casmurro". Abaixo, assista a um vídeo com sugestões de professores sobre o melhor livro de cada estado brasileiro: Qual é o melhor livro de cada estado brasileiro? Professores votam ☠️O que explica o arrebatamento por 'Memórias Póstumas de Brás Cubas'? Livro de Machado de Assis faz americana viralizar no TikTok Abaixo, confira: o que faz do livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas” algo tão arrebatador; por que ler resumos ou adaptações é “abrir mão de uma herança milionária”. Não é a primeira vez que o talento de Machado de Assis é reconhecido internacionalmente, claro. Para citar um exemplo deste século, o escritor americano Philip Roth (1933-2018) declarou sua admiração pelo brasileiro em 2008, comparando-o ao dramaturgo irlandês Samuel Beckett (1906-1989). ➡️Hélio de Seixas Guimarães, professor de literatura brasileira na Universidade de São Paulo (USP), conta que as principais obras de Machado "estão traduzidas para praticamente todas as línguas modernas e publicadas por boas editoras de vários países". "Machado de Assis tem bastante prestígio internacional, que só fez crescer a partir da segunda metade do século 20, principalmente nos meios acadêmicos e mais cultos", explica Guimarães, que também é vice-diretor da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, em São Paulo, e coordenador da coleção “Todos os livros de Machado de Assis”, da Todavia/Itaú Cultural. E uma curiosidade: foi justamente a tradução da americana Flora Thompson-DeVeax para o inglês – versão lida por Courtney – que ampliou o alcance de “Memórias Póstumas” no exterior. “Machado sempre atingiu um público restrito fora do Brasil. Isso talvez tenha começado a mudar com a tradução recente de Thomson-DeVeaux, que teve um lançamento bem-sucedido e agora chegou às redes sociais. Tomara que isso ajude Machado de Assis a entrar em circuitos mais amplos de leitura”, diz Guimarães. A tradutora comemorou o sucesso de seu trabalho. No Twitter, Flora postou: "Eu vi o vídeo [da Courtney], gente! Fiquei feliz demais de ver alguém tendo a mesma reação que eu quando eu li 'Brás Cubas' pela primeira vez com meu português precário: espanto e indignação de não ter convivido com o Machado desde sempre". E aconselhou: "presenteiem os amigos gringos, espalhem essa alegria!". Um 'defunto-autor': “Memórias Póstumas de Brás Cubas” é contado por um “defunto-autor”: o personagem principal, Brás Cubas, traça sua própria biografia direto do túmulo. A dedicatória, apresentada logo no início da história, já deixa evidente a mistura entre ironia, humor e horror: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas.” Não vamos aqui dar nenhum spoiler, claro. Mas veja aspectos de destaque da obra, que ajudam a explicar por que Courtney estava quase terminando as 300 páginas em um só fim de semana: ✏️Irreverência na linguagem: “Penso que o próprio livro diz o que há nele de muito especial: a mistura muito peculiar de galhofa e melancolia, de riso e seriedade. Consegue o feito de ser muito profundo, em muitos sentidos terrível, e ao mesmo tempo muito engraçado e divertido de ler. Há ali uma irreverência e uma liberdade de espírito que só encontramos muito raramente na literatura de qualquer tempo e lugar”, diz Hélio de Seixas Guimarães. ????Revolução na literatura de seu tempo: Fernando Marcílio, professor de literatura do Curso Angl

Após viralizar com 'Memórias Póstumas', americana diz que lerá 'Dom Casmurro': 'Pressão dos brasileiros!'

Courtney Henning Novak, de 45 anos, lançou um desafio pessoal: ler um livro de cada país do mundo. Brasil, no entanto, fez com que ela 'desrespeitasse' o próprio regulamento e incluísse mais uma obra de Machado de Assis na lista. Courtney Novak começará a ler 'Dom Casmurro' Reprodução/Instagram Quando começou a ler "Memórias Póstumas de Brás Cubas", a escritora americana Courtney Henning Novak ficou tão obcecada pela obra de Machado de Assis que viralizou nas redes sociais com uma pergunta: "O que vou fazer do resto da minha vida depois que terminá-lo?”. Bom, ela decidiu que rumo tomar. ????????Nesta quinta-feira (6), Courtney anunciou que devorará "Dom Casmurro", outro clássico do autor brasileiro. Com um parque de diversões ao fundo, ela tirou uma foto segurando um exemplar da obra e escreveu, na legenda, que estava "no ambiente perfeito para começar sua nova aventura". "A pressão dos brasileiros é impressionante!", declarou. Ela provavelmente se refere à enxurrada de comentários tentando convencê-la a ler a história de amor de Bentinho e Capitu, publicada em 1899. ????Com perdão pelo trocadilho, mas a verdade é que a americana traiu (ou não?) o regulamento de seu próprio projeto pessoal: ela pretendia ler apenas uma obra de cada país do mundo, em ordem alfabética. Mas não imaginava que encontraria Machado de Assis no caminho. "Memórias Póstumas" foi uma experiência tão arrebatadora que a obrigou, antes de partir para as nações começadas pela letra "C", a incluir um "bônus" na categoria "Brasil". Aguardemos o próximo vídeo apaixonado de Courtney com a resenha de "Dom Casmurro". Abaixo, assista a um vídeo com sugestões de professores sobre o melhor livro de cada estado brasileiro: Qual é o melhor livro de cada estado brasileiro? Professores votam ☠️O que explica o arrebatamento por 'Memórias Póstumas de Brás Cubas'? Livro de Machado de Assis faz americana viralizar no TikTok Abaixo, confira: o que faz do livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas” algo tão arrebatador; por que ler resumos ou adaptações é “abrir mão de uma herança milionária”. Não é a primeira vez que o talento de Machado de Assis é reconhecido internacionalmente, claro. Para citar um exemplo deste século, o escritor americano Philip Roth (1933-2018) declarou sua admiração pelo brasileiro em 2008, comparando-o ao dramaturgo irlandês Samuel Beckett (1906-1989). ➡️Hélio de Seixas Guimarães, professor de literatura brasileira na Universidade de São Paulo (USP), conta que as principais obras de Machado "estão traduzidas para praticamente todas as línguas modernas e publicadas por boas editoras de vários países". "Machado de Assis tem bastante prestígio internacional, que só fez crescer a partir da segunda metade do século 20, principalmente nos meios acadêmicos e mais cultos", explica Guimarães, que também é vice-diretor da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, em São Paulo, e coordenador da coleção “Todos os livros de Machado de Assis”, da Todavia/Itaú Cultural. E uma curiosidade: foi justamente a tradução da americana Flora Thompson-DeVeax para o inglês – versão lida por Courtney – que ampliou o alcance de “Memórias Póstumas” no exterior. “Machado sempre atingiu um público restrito fora do Brasil. Isso talvez tenha começado a mudar com a tradução recente de Thomson-DeVeaux, que teve um lançamento bem-sucedido e agora chegou às redes sociais. Tomara que isso ajude Machado de Assis a entrar em circuitos mais amplos de leitura”, diz Guimarães. A tradutora comemorou o sucesso de seu trabalho. No Twitter, Flora postou: "Eu vi o vídeo [da Courtney], gente! Fiquei feliz demais de ver alguém tendo a mesma reação que eu quando eu li 'Brás Cubas' pela primeira vez com meu português precário: espanto e indignação de não ter convivido com o Machado desde sempre". E aconselhou: "presenteiem os amigos gringos, espalhem essa alegria!". Um 'defunto-autor': “Memórias Póstumas de Brás Cubas” é contado por um “defunto-autor”: o personagem principal, Brás Cubas, traça sua própria biografia direto do túmulo. A dedicatória, apresentada logo no início da história, já deixa evidente a mistura entre ironia, humor e horror: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas.” Não vamos aqui dar nenhum spoiler, claro. Mas veja aspectos de destaque da obra, que ajudam a explicar por que Courtney estava quase terminando as 300 páginas em um só fim de semana: ✏️Irreverência na linguagem: “Penso que o próprio livro diz o que há nele de muito especial: a mistura muito peculiar de galhofa e melancolia, de riso e seriedade. Consegue o feito de ser muito profundo, em muitos sentidos terrível, e ao mesmo tempo muito engraçado e divertido de ler. Há ali uma irreverência e uma liberdade de espírito que só encontramos muito raramente na literatura de qualquer tempo e lugar”, diz Hélio de Seixas Guimarães. ????Revolução na literatura de seu tempo: Fernando Marcílio, professor de literatura do Curso Anglo (SP), explica como Machado de Assis quebrou o padrão do Romantismo da época. “Com ‘Memórias Póstumas de Brás Cubas’, Machado foi iniciador de uma nova estética no Brasil: o Realismo. A gente costuma dizer que ele foi um gênio porque questionou as bases da literatura de seu próprio tempo ao escrever um romance realista – realista nas bases do século XIX, desnudando a realidade humana e desfazendo as ilusões românticas", diz. "Por exemplo: Brás Cubas mede o envolvimento com uma mulher a partir do dinheiro que gastou com ela. Quer algo menos ‘amor romântico’ do que isso?” ????Representação do ser humano (de qualquer lugar do mundo): As críticas sociais em “Memórias” não são explícitas como em “O Cortiço”, por exemplo, de Aluísio Azevedo. Mas isso não significa que não haja uma representação dos seres humanos (e da sociedade brasileira). “As personagens machadianas querem parecer algo que não são. Brás Cubas, por exemplo, vive da aparência. E nós tínhamos, no Brasil, a mesma hipocrisia: um discurso liberal, mas em uma sociedade ainda escravocrata”, afirma Marcílio. O professor Hélio Guimarães reforça a universalidade do que é retratado na obra. “Um livro como ‘Memórias póstumas de Brás Cubas’ permite conhecer melhor não só a história e a cultura brasileiras, mas a espécie humana, pela visão de uma das pessoas mais inteligentes, sensíveis e cultas que já viveram no Brasil”, afirma. E, por mais que a representação seja fiel à realidade do século XIX, não deixa de ser atual e de gerar identificação com os novos leitores. “Lendo a obra, os jovens podem tomar consciência e enxergar a raiz e o problema de dilemas sociais com que vivemos até hoje. Os personagens são pessoas que conhecemos. Todos nós temos referências de Brás Cubas ou Marcelas [outra personagem] nas nossas vidas”, diz Heric José Palos, coordenador de literatura do Curso Etapa (SP). ????Por que você deve fugir dos resumos? “Memórias Póstumas de Brás Cubas” frequentemente integra a lista de obras obrigatórias de vestibulares. Esteve, por exemplo, na relação de livros da Fuvest, da Universidade de São Paulo (USP), por longos períodos, como de 2013 a 2019. Na internet, é possível encontrar dezenas de resumos da obra. Bom, você deve imaginar que nenhum professor aprovará a ideia de trocar a leitura de um livro por uma página de síntese. “É importante ler Machado, porque foi o melhor autor que produzimos no Brasil em todos os tempos. É como alguém deixar uma herança milionária, mas você recusar. Recusar Machado é recusar o que de melhor foi produzido na nossa cultura”, diz Fernando Marcílio. “O que está por trás das adaptações e dos resumos é só o que acontece, e não como acontece. É um rebaixamento do leitor. Existem edições originais com notas de rodapé explicativas que podem ser úteis para aprender e entender o desconhecido.” Heric, do Etapa, afirma também que o resumo limita qualquer percepção mais ampla ou crítica do estudante. “É fácil resumir: o livro é a história de um cara morto que conta sua própria vida. Mas não é só isso o que interessa. Não é o que ele faz, e sim por que ele faz. Lendo a íntegra, o leitor vai ter uma visão mais profunda dos personagens, com a linguagem refinada, sagaz e elegante de Machado de Assis.” Vídeos Abaixo, veja a correção de uma questão do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2023 sobre Machado de Assis: Enem 2023: correção da questão de Filosofia sobre texto de Machado de Assis